segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Hugo de Sousa - A Entrevista

Trabalha em televisão porque assim sonhava na sua adolescência. Fala sobre o fim de Morangos com Açúcar e conta como se sentiu ao ganhar um Emmy com a novela Meu Amor. O futuro da ficção nacional? «Portugal está no bom caminho»
Nasceu a 23 de Junho de 1977. É o Director de Projecto da novela O Beijo do Escorpião


Trabalhar em televisão e para televisão na área da ficção era um sonho? Como é que surgiu?
Desde a adolescência que tinha o bichinho da televisão. Já nos tempos de escola andava sempre com uma handycam (câmara de filmar) a fazer os meus filmes. Tive a sorte de estudar numa escola que já naquela altura tinha um Centro de Produção Audiovisual e foi aí que comecei a desenvolver a técnica.


Como é que se distingue um bom de um mau produto em ficção?
Isso é muito subjectivo. Na minha visão, penso que um bom produto de ficção acima de tudo tem que entreter. Esse é o meu principal objectivo. Se associado a isso a ficção conseguir ser educativa e informativa, melhor. A ficção deve fazer sonhar e criar emoções (rir, chorar, etc.) e se um produto conseguir “tocar” de alguma forma no espectador, então é boa ficção.

Morangos com Açúcar (TVI) foi uma das séries mais marcantes em Portugal e deu lugar a um filme. Achas que a série devia ter continuado no ar?
Acho que devia pelo menos ter tido mais um ano e anunciar essa como a última série para que pudéssemos ter tido um grand finale. Mas defendo a teoria de que tudo tem um fim e que os Morangos deviam ter acabado.

Para ti, quais foram os talentos que mais se destacaram em Morangos com Açúcar?
É difícil para mim destacar nomes já que foram muitos e de uma forma ou outra todos ficaram no meu coração. Mas há, sem dúvida, alguns nomes que são incontestáveis como o de Filomena Cautela, Pedro Caeiro, Sara Matos, Pedro Carvalho, Sara Prata, Gabriela Barros, Ricardo Sá, Diogo Branco, etc.

Vamos a um grande momento do teu percurso profissional. Como é que te sentiste ao ganhar um Emmy com a novela Meu Amor?
Foi um momento estranho. Um Emmy era algo em que nunca tinha pensado e quando surgiu a nomeação todos achámos que aquilo já era demais para o português (pensamento típico). Mas ao chegarmos lá percebemos que, efectivamente, havia hipóteses de ganharmos. A vitória aconteceu.  Senti-me estupidamente feliz. Foi sem dúvida um dos pontos mais altos da minha carreira que vou recordar sempre.

A fasquia em torno das novelas aumentou depois do Emmy?
Claro que sim, embora depois do prémio a nossa vida volte ao normal mas, efectivamente, sente-se um olhar sobre o nosso trabalho que nos obriga a fazer melhor. Ter um Emmy acaba por ser uma responsabilidade.

Estás actualmente na novela O Beijo do Escorpião. Como está a correr?
A novela está a correr muito bem. Acredito que temos uma grande história e que a nível artístico consegui fazer grandes avanços. Temos ainda que dar tempo ao espectador para se habituar a um estilo diferente de narrativa.

O que é que podemos esperar da história que aborda assuntos tão sensíveis da nossa sociedade?
Pela primeira vez vamos abordar temas a fundo (não de forma superficial) como a homossexualidade, sexo na adolescência pela web, violência doméstica na alta sociedade, entre outros. Estes temas são sempre muito fortes e causadores de discórdia e por isso, normalmente, são evitados. Aqui vamos ao fundo da questão.

A vilã da história, Sara Matos, que interpreta a Alice, tem recebido excelentes críticas. Esperavas esta reacção tão positiva e imediata em relação à Sara?
Não tinha qualquer dúvida. Ela é, sem dúvida, umas das melhores actrizes da geração dela.

Que surpresas podemos esperar vindas desta história?
Se dissesse deixava de ser surpresa.

Para quem não sabe, como é que se escolhe o elenco de uma novela? Quais são os processos pelos quais um actor passa até ficar com a personagem?
Depende muito. Nas novelas da noite, quando recebo a sinopse, começo logo a imaginar quem poderia interpretar aqueles personagens e acabo por elaborar um organograma com a proposta de elenco que depois vai à aprovação da TVI. Se houver algum personagem para o qual não consigo imaginar alguém, ou se queremos de alguma forma um cara nova, aí passamos ao processo de casting.
No caso dos produtos juvenis como os Morangos e o I Love it, aí entramos logo no processo de pré-selecção com várias etapas de casting. Mas, infelizmente, o mercado em Portugal é demasiado pequeno, o que nos obriga a trabalhar com elencos mais conhecidos.

Na estreia, O Beijo do Escorpião liderou. Entretanto, Sol de Inverno (Novela da SIC) tem ganho diariamente. Achas que o facto da novela da estação de Carnaxide estar no ar há mais tempo tem efeito nos resultados?
Claro que sim. Não podemos pedir aos espectadores que assistem há vários meses a um produto que de um dia para o outro mudem todos para o que está no canal vizinho. É um processo normal.

A forte concorrência alimenta o desejo de fazer bons produtos em ficção?
Claro que sim. Quanto melhor for a concorrência mais nos obriga a fazer melhor. Evita que fiquemos à sombra da bananeira.

Que actores destacas na ficção portuguesa?
Não gosto de destacar actores. Claro que tenho as minhas preferências mas não devo publicamente exprimi-las. Para mim, ser bom actor não chega. Tem que ser um bom ser humano e ser um bom elemento de uma equipa de trabalho.




Se pudesses ir buscar algum actor à concorrência, quem seria?
Acho que já trabalhei com quase todos eles mas neste momento ia buscar  uma grande actriz e uma grande amiga, a Maria Emília Correia.

Para terminar, como é que imaginas a ficção portuguesa daqui a dez anos?
Imaginar é uma coisa, dizer como gostava é outra. Por isso vou dizer aquilo que gostava. Era importante que apostássemos em formar bons autores. Temos alguns mas precisamos de mais. A escrita é a matéria prima de uma boa obra de ficção. Gostava que se investisse em séries mas como a série é um produto muito caro, e financeiramente muitas vezes inviável, seria necessário mais apoios do estado.  Mas, seja como for, acho que Portugal está no bom caminho. O facto é que já por duas vezes fomos premiados pelos óscares da televisão e já começamos a exportar os nossos produtos. É um sinal de prosperidade. 

Obrigado, Hugo!




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